segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Amores perdidos



Andava meio na solidão quando te encontrei, nos encontramos amor.
Era um fim de tarde, o sol quente torrenciava o céu alaranjado e aos poucos descia para o seu abrigo secreto. Naquele instante eu era nuvem, uma daquelas que enfeitam o céu de algodão e poucas vezes, tristonha, escurecem e choram na terra. Naquela tarde eu era uma nuvem carregada, escura, que tampava o sol e penumbrava o ar.
Impatei o sol de brilhar, escondi, não o deixei se pôr para todos.
Nuvem mal criada, bati, chorei e pela noite inteira inundei a cidade. De olhos fechados e entregues ao pranto não percebi o transtorno que causei lá embaixo, derrubei fios tensos, desabriguei animais, maltratei os da rua. Deixei carros bagunçados, pessoas encolhidas, coisas estraçalhadas; me senti a pior nuvem de todos os tempos. Esvaziei, passei dias seca sem formar nada e sair do lugar. Me fiz invisível no ar. Passei dias observando os outros astros, assisti vários espetáculos do sol, da lua, das estrelas, tudo tão belo, tão perfeito olhado de fora. Ao pensar nos outros, pensei em mim, nunca tinha, me exigia tanto para dar aos outros tudo, mas para eu mesma, nunca.
Já era noite quando eu, transparente, fazia parte de um cenário apaixonante. Sem alertar, o vento me levava para uma direção contrária, sem hesitar escorreguei e foi então que notei ao meu redor exuberantes nuvens que passavam apressadas e macias, eu não notara antes, mas as formas me eram familiar. Ao mudar, encostei sem querer numa nuvem graciosa que passava calmamente ao meu lado, foi um instante o suficiente para os meus olhos brilharem mais que qualquer estrela, ela também ficou a me olhar, senti. Andamos calmamente, lado a lado, feito uma estrada de mão dupla. Assim anoitecemos, tardamos, madrugamos, enfeitamos, chovemos e esquentamos dias e noites. Tiramos sorrisos dos que nos apontavam, banhamos os beijos dos românticos e sonhamos com os amantes.
Passados quase mil dias, um sopro chegou estranho, tinha vindo para avisar algo, mas não consegui captar. Uma noite escura se abrigou, o negro tomou conta do mundo, a luz se aflorou onde nenhum sol brilhou, uma tempestade jamais vista bagunçou a pista, nuvens tresloucadas e desesperadas agitavam o céu, eu a perdi de vista; nos perdemos.
Adormeci e despertei numa manhã sem escuro, e sem minha nuvem ao lado. A tarde, a noite, a madrugada tomou, a manhã chegou e a nossa estrada nunca mais voltou a ser a mesma. Nunca mais andamos lado a lado; nos perdemos, amor.

_Vou ficar perdida aqui no céu, voando, até te encontrar, nuvem.

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